terça-feira, 29 de junho de 2010

Apresento-vos um sorriso.

E eu conheci esse cara na Argentina. Camiseta branca com gola em V fumando um cigarro na frente de onde estávamos hospedados. Olhares cruzados. Olhos claros, que a princípio achei serem azuis [hoje sei que são verdes]. Nenhum sorriso, apenas curiosidade. "Pessoa intrigante", pensei.

Encontro-o no bar. Ele não sabia que eu curtia, mas algo me dizia que com ele rolaria. É o tal do radar que funciona bem comigo. Já o dele parece ser meio falho. Conversamos por muito tempo enquanto bebíamos alguns chopes. Falamos sobre viagens e sobre livros. Descobrimos que eu morava perto de seus pais e ele dos meus. Falamos sobre qualidades do ser humano e ao falar de Siddharta, de Hermann Hesse, sorrimos [e aí me dei conta de como seu sorriso era bonito] ao discutir possibilidades não místicas para o jejuar. Ele disse que era gay. Eu ignorei a fala como se fosse dispensável e mantive a conversa no que ele me cativava. Ele saiu para jantar e não voltou.

No dia seguinte, falamos sobre as festas de Buenos Aires e sobre quão ruim era a fama de seu reveillon. Chamei-o para passar a pós-virada de ano em uma danceteria famosa por ser considerada o melhor local gls da cidade. Ele estranhou e perguntou se eu tinha noção de que tipo de festa era. Eu acenei a cabeça sem maiores explicações.

Fui jantar com amigos argentinos em outra cidade. Juntos brindamos e juntos fomos à danceteria. Meu amigo dos parágrafos anteriores, por sua vez, havia saído para jantar com os pais e me encontrou na balada. Lá nos divertimos, lá convidei-o a tomar uma tequila. Lá olhei diretamente em seus olhos, que pareciam evitar os meus a princípio. Foi lá também que nos beijamos pela primeira vez. Primeiro beijo no primeiro dia do ano.

No retorno, toques ousados em meio à cidade que acordava. Qualquer muro era desculpa para beijos e abraços. É a vantagem de sentirmo-nos de fora de um lugar, uma vez que a ausência próxima nos serve de escudo.

Nos dias seguintes, mais beijos, sem sexo consumado. Decisão consciente. Era um cara que valia a pena construir intimidade primeiro. Na despedida, me levou ao táxi. Fiquei triste ao deixá-lo para trás. Depois ele me disse que o mesmo aconteceu com ele. Afinal, sabíamos que ficaríamos 3 meses sem nos vermos. Ele voltaria ao Brasil, eu tinha uma parada intermediária do outro lado do mundo. Se hoje eu fosse escolher uma música que retratasse bem o momento da despedida, com certeza seria "Crimsom and Clover", de Tommy James & The Shondells.

Mas muita coisa acontece em 3 meses. Trocávamos e-mails. Não sabia o que queria com aquele escambo de ideias, de cotidiano e de intimidade. Não o conhecia bem o suficiente. Senti-me afetado por ele quando confessou em alguma linha perdida que lhe fazia bem ler minhas cartas eletrônicas. Eu queria conhecer pessoas de culturas e locais que até então me eram exóticas e aquele sentir-se afetado me incomodou. Não era hora. Diminuí o fluxo de nosssa correspondência. Ele percebeu e quando voltei ao nosso país, ele namorava outra pessoa.

Ficamos amigos. Eu me interessei por outra pessoa [que eu acho que magoei por esses tempos e gostaria de escrever um post sobre isso, pois ele realmente merece]. Seu namoro acabou. Reencontramo-nos em um momento turbulento e voltamos a sair juntos. Apesar disso, circunstancialmente, não havia como dar certo. Além de sermos pessoas um bocado diferentes, se 3 meses fazem diferença, uma vida distante faz mais ainda. Na onda de desencontros eu passarei 8 meses fora e quando voltar, ele concretizará planos há muito elaborados para fazer vida em outro país.

Combinamos de não nos envolvermos, mas acho que não zelei muito pelo acordo. Há algumas semanas, convidei-o para sairmos como amigos. Não deu certo e a noite terminou em discussão. Percebi que era apenas discurso meu em atitude defensiva. No dia seguinte à discussão, saímos para conversar pela primeira vez sobre o que se passava e acabamos passando a noite juntos. Uma noite e tanto, há que se frisar. Um clique aconteceu ali e até agora eu não sei muito bem como explicá-lo. Mais tarde, tive que viajar e, à noite, sorri bobo ao ler uma mensagem que me enviou dizendo que tinha gostado de minha companhia. Na segunda, me peguei com vontade de abraçá-lo pela manhã como no dia anterior.

Desde então nossa harmonia cresceu incrivelmente. Temos nos visto constantemente. Ele precisou fazer uma viagem essa semana. Eu farei outra na terça. Ficaremos algumas semanas sem nos vermos. E agora, com saudades dele, fico imaginando como seria sua letra de mão.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Sobre Armários e Chaves

Sumi mesmo. Assumo. Motivo simples e já deve ter passado pela cabeça de muitos leitores. Comecei a sair com alguém legal e não queria expô-lo. Além disso, quebrei o braço um dia depois de ter escrito o último post [mas viva, pela manhã obtive a alforria do gesso!]. Hoje, contudo, deu vontade de escrever, deixando vocês ao som de "My wandering days are over", de Belle & Sebastian.

Esse tempo sem postar e uma briga em família [feia e superficial, mas com danos sérios] me fez reavaliar muita coisa. Uma delas [e que acho que é a que importa comentar aqui no blog] é sobre a situação em que eu vivo. Vida paralela excluindo família, amigos próximos, trabalho etc. Tudo em nome do que? De uma sexualidade a ser guardada a sete chaves.

As três desculpas mais comuns que uso para eu estar no armário são: 1) Receio de isso atrapalhar minha carreira; 2) Alterar as relações de amizade que eu tenho; 3) Sexualidade é só um detalhe.

No fundo há uma palavra que responde bem às três razões: Bullshit! Crenças irracionais construídas no imaginário de uma geração que ainda mantém os receios do passado. Pensando com calma e avaliando minha volta sei com certeza que minha carreira não seria nem minimamente tocada [conheço pessoas na mesma profissão assumidas e bem posicionadas], tenho relações sólidas o suficiente com pessoas com uma boa clareza de mundo para saber que meu envolvimento com elas não será abalado e, quanto ao terceiro ponto, na ânsia de esconder a sexualidade, acabo por colocar um certo limite para a intimidade com alguns amigos, com receio que a proximidade possa me denunciar de algum modo.

E por que, então, cargas d'água, Ragazzo, você não desencana de vez? E a resposta que eu tenho é simples. Por vergonha da vida paralela que construí até hoje com pessoas que me são caras. É como se eu tivesse escondido, mentido e omitido por muito tempo para pessoas que em mim depositavam muita confiança. Eu que, paradoxalmente, odeio mentiras, estaria assumindo uma grande que durou grande parte da vida.

Mas, tenho culhões... Covardia não é um defeito meu. E por algum lugar comecei. Divido casa com dois caras. Essa semana tomei coragem e fiz o que já tinha que ter feito há tempos. Chamei eles para uma conversa.

Fui preparado e com uma estratégia. Montei um arquivo com fotos de pessoas, homens e mulheres, que já tive algum envolvimento. Chamei os dois amigos. Servi um vinho para nós três para dar uma relaxada e convidei-os para uma espécie de brincadeira. Desafiei-os a descobrir o que as pessoas que eu apontava nas fotos tinham em comum.

Eles toparam. Eu me divertia com os chutes [eles realmente entraram na brincadeira].

- Hum... Barba por fazer? - um deles chutou.

- Tem que ser algo comum a todos das fotos e não tô vendo nenhuma menina de buço aqui... hehe - eu respondi.


- Essa eu conheço. É sua ex-namorada. - um deles falou.

- Certo.

- E essa eu sei que você já saiu.

- Certo também. Tá ficando quente. - eu confirmei.


Alguns muitos chutes depois, um deles soltou: - Você já saiu com todos eles?

- Bingo!

Alguns segundos de silêncio, conversa um pouco embaraçada no começo. Deixei claro que não estava contando para ganhar espaço em casa, mas como demonstração de confiança, pela amizade construída. Expliquei algumas fugidas minhas do passado, momentos que eu não estava bem e não deixava claro a razão. Eles me abraçaram. Disseram que eu podia confiar neles e que a amizade só ia se fortalecer.

O mais legal é que não foi da boca pra fora. Desde então estamos cada vez mais próximos. Ficamos mais íntimos. Trocamos histórias. Temos saído mais juntos. Um deles, inclusive, quer conhecer algum lugar gls comigo.

Valeu a pena. Um primeiro passo para uma vida em que intenciono usar minha energia em assuntos que realmente valham a pena e menos em um problema com minha sexualidade que muitas vezes só se encontra em minha cabeça.