domingo, 27 de setembro de 2009

A Urgência do Corpo

Promiscuidade é uma característica comumente atribuída ao mundo gay. Por outro lado, volta e meia encontro profiles de caras que procuram outros com uma certa rejeição a isto. Eu mesmo em discurso sempre fui contrário a ela.

Promiscuidade me lembra vazio e superficialidade, duas características que realmente não gostaria de ter em minha vida.

Contudo, parei para pensar por esses dias em quantas pessoas eu já saí até hoje. Assustei-me quando percebi que sem sombra de dúvida o número rondava os 3 dígitos. Só este ano devo ter saído com mais de uma dezena de pessoas. Mas, pensando melhor, percebi que não é algo próprio de caras que curtem caras, mas dos jovens em geral na atualidade. Lembrei, por exemplo, dos adorados carnavais, em que beijar 5 garotas na noite e terminar na cama de uma era frequente.

E o que há diferente quando se sai com caras? Em termos quantitativos, creio que dá no mesmo. Talvez até menos. Afinal, o flerte na rua é coibido. Não se demonstra o desejo com a mesma frequência.

Agora, quando dois caras se encontram, os limites ficam prejudicados. A lei do desejo parece imperar. Um potencializa o outro. É impressionante como dois caras buscam uma intimidade física com uma pressa como se o mundo fosse acabar no dia seguinte. É urgência pura.

Saio com um cara, curto o papo e penso: "Cara gente boa. Vale a pena investir em um conhecimento mais ponderado. Sem pressa.". Algumas cervejas e algumas trocas de olhares depois, mudo o pensamento para "Como que eu faço para ficar sozinho com esse cara?". E a história se repete na mesma velocidade em que o volume nas calças cresce.

Outro dia, divagando a respeito, cheguei a uma conclusão [paradoxalmente temporária] que homens são tão reprimidos em seu desejo por um igual no dia-a-dia que, quando veem oportunidade de exercerem-no, vão às últimas consequências.

Engraçado como a lógica de conhecimento do outro se inverte. Nesse caminho, conhece-se a intimidade do corpo primeiro, e a pessoa depois. Isso, claro, quando se quer conhecer o outro. Já conheci pessoas [e assumo que já tive essa fase também] em que acalmar o corpo era o suficiente para não enlouquecer a alma. Daí a relação corpo com corpo bastar.

Há alguns minutos me convidaram para sair nessa relação corpo-corpo [e só]. Recusei. Preferi jogar futebol com bons amigos. Hoje o valor do corpo no câmbio está baixo e da alma, alto.

domingo, 20 de setembro de 2009

Top or bottom?

Em chats, conversas de msn e mecanismos de conhecimento em geral volta e meia a célebre frase aparece:

"Você é ativo ou passivo?"

E digo, em geral me desinteresso da pessoa ao escutar essa pergunta. Minha resposta de praxe é: "Não sou homem de receitas. Tudo depende muito do clima, do contexto, da pessoa com quem se está junto etc.".

É... mas isso é apenas meia verdade.

Certa vez, na cama com um cara com quem eu já tinha certa intimidade, após algumas tentativas minhas de ir um pouco além do que até então tínhamos ido, este me falou algo que me fez muito pensar.

- Ragazzo, você me dá muito tesão e eu só não dou para você por um único motivo: porque sei que no fundo você não encara a passividade muito bem.

Ia retrucar, mas engoli a seco essa afirmação, pois sabia que tinha um bocado de verdade nela.

Por mais que em discurso eu diga que não há diferença, na prática sei que a coisa não é tão simples assim. Prova disso é que já saio com caras há mais de 10 anos e nunca fui passivo na relação. E assumo, com certo constrangimento irracional, que já tive vontade algumas vezes.

Por um lado, sexo é sexo. É entrega, é envolvimento. E daí não fazer sentido se atribuir aprioristicamente os papéis a cada um. Por outro, há todo um respaldo social para a desvalorização daquele que se deixa invadir, que assume a possibilidade de receber.

Acabo usando a desculpa esfarrapada do receio da dor, que não faz sentido fazer algo que não me dá prazer etc. Na verdade, o buraco é mais embaixo. Por mais reflexivo que eu seja, sei que tenho [muitos] preconceitos. E aí reside a razão de escrever sobre isso. Poderia maquiá-los, encobrindo-os com um discurso. Prefiro expressar o duelo entre aquilo que racionalmente já está claro e aquilo que emocionalmente ainda incomoda.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Na Calada da Noite

Provavelmente tarde da noite.

Um grupo de amigos resolve participar de uma oficina juntos. Já se conhecem bem há muito tempo e será uma oportunidade de terem algum tempo de qualidade fora das responsabilidades do dia-a-dia.

Já no dia do curso, todos animados, professor simpático e atencioso. Em uma das atividades, precisamos carregar uma espécie de escultura de madeira. É algo longo, desajeitado para se levantar. Cada um tem o seu. Antes de pegar o meu, percebo que as pessoas têm dificuldades de carregar tal "cruz". Penso: "Será que consigo? Vai ficar feio se eu desabar agora". Por outro lado vejo algumas garotas que, ainda que suando um pouco, conseguem levar seu fardo. Isso me acalma um pouco.

Admiro a imponência de meu objeto. Primeiro o olho fixamente, depois imagino a melhor forma de levantá-lo. Após breve avaliação, sinto-me pronto a desafiá-lo. Encosto, mas aquilo queima. Esforço-me, esqueço da dor e tento levantá-lo. Foi em vão. Perco minhas forças. A cruz desfalece. Torno-me o centro das atenções. Olhares apavorados se voltam a mim. Silêncio.

Segue-se um grito: "Ele é um vampiro". Anos de amizade parecem se quebrar em um segundo. Antigos amigos começam a correr em fúria com estacas empunhadas em meu encalço. Eu fujo. Sei que sou forte e que a fuga não será problema. Afinal, vampiros são bem conhecidos pela força sobre-humana. Também sabem o que os outros pensam, o que facilita a escolha por qual caminho seguir.

Não, o problema não é a fuga. O ponto é que tudo terá que ser reconstruído novamente. É uma volta ao pó, sem a menor noção do que virá. Risco puro. A única certeza é que nada será igual e que tudo pode novamente acontecer. O triste é que o vampiro gostava daquele mundo dos vivos. A única diferença era que ele era um morto-vivo. A pena é que depois de se ter mostrado vampiro, a única coisa que aqueles amigos de anos viam eram seus dentes e sua sede por sangue. Todo o resto se perdeu.

Acordo suado.

Engraçado como sonhos falam de nossas urgências, de nossos medos. Apesar da linguagem simbólica, alguns são extremamente claros. Esse ocorreu há duas noites. Ainda lembro com aflição. Foi um lembrete do inconsciente de que vampiros não conseguem se esconder a vida inteira e dos medos que isso causa em mim.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Custo x Benefício

Adoro ir a botecos com amigos, mas não a bares mais ajeitados.

Em botecos, a conversa rola solta. Ninguém está nem aí para nada. Amigos aproveitam de amigos. Ali se está pelas companhias da mesa e não pelo que há fora dela.

Em bares mais ajeitados a coisa não rola assim. Pavões se mostram. Os discursos são monossilábicos. A graça da noite se resume a sair com alguma garota. Começa-se com um alto grau seletivo que decresce à medida que a quantidade de cervejas e de idas ao banheiro [assim como o desespero de passar a noite sozinho] aumenta. Ganha a noite quem mostra seu troféu ao fim dela.

Isso me cansa, mas nem por isso deixo de participar desse jogo que cada vez mais se torna bobo e sem sentido.

Fim-de-semana passado estava bem a fim de uma noite sem muitas regras. Contudo, em uma cidade distante com alguns amigos próximos, não havia escapatória de sair com eles para uma noite que já sabia se assemelhar bastante com a situação supracitada.

Já no bar, entrei no jogo. Monólogos entre os amigos, flertes direcionados. Escolhi minha vítima. Mostrei interesse em um primeiro momento. Fingi desinteresse no seguinte. Continuamos nessa dança até que a garota convidou-me a sentar com ela e sua amiga.

Aceitei o convite. Garotas que não eram um modelo de beleza, mas muito simpáticas. Fui envolvendo-as com os olhos a prometer uma noite e tanto para os três. À distância, sabia ser observado. Algum tempo depois, meus amigos vieram se despedir com um sorriso maroto e batidas nas costas. Sabiam que "a noite era minha".

Já sozinho há algum tempo com as garotas no bar, convidaram-me para um lugar mais "sossegado". Sorri e disse que tinha outros planos. Cumprimentei as duas, que se mostraram um tanto quanto decepcionadas, e me fui.

De lá fui para uma festa alternativa. Tive uma noite e tanto. Cheguei no quarto de hotel, que dividia com um dos amigos que estavam comigo no bar, às 6h da manhã, uma hora antes da reunião que teríamos às 7h.

É claro que a história do "Ragazzo e das duas garotas" se espalhou. Passei o dia meio quietão. Os amigos chegavam em mim e diziam sacanamente que eu estava calado porque tinha usado toda minha energia durante a noite com as duas garotas. Escutava sem responder, omitindo para não mentir.

Eles não sabiam que na verdade eu estava era de mau humor, sentindo-me mau pra cacete por ter usado duas garotas para me encobrir. Joguei um jogo sem explicar a elas as regras. Fui cínico.

Nesse dia pensei como o preço de se estar no armário é alto. Talvez alto demais.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Aventuras e Desventuras de um Bissexual Ragazzo

Já é sabido que não sou fã de rótulos sociais, especialmente aqueles relacionados à sexualidade. Evito aquilo que limita ao invés de libertar. Daí praticamente não usar as palavras gay ou homossexual no blog. Agora, o leitor atento irá se perguntar: “Que cara contraditório o Ragazzo. Afinal, o título do blog não carrega um rótulo?”. A este respondo sem pestanejar: “Sono d'accordo”.

Há muito me incomoda o título. Volta e meia me sondam e buscam indícios se sou isso ou aquilo, se sou bi, homo, pan, bi, tri ou o-que-seja-sexual. E, sinceramente, os nomes são o que menos importam. Tenho histórias aqui que gosto de compartilhar com vocês, pensar a respeito, refletir, compreender, abrir-me às suas.

Não há como negar que há uma pedra angular que direciona meus escritos e que também chama a atenção de vocês. Sexualidade é o tema principal. Isso é fato. Contudo, a riqueza está no que se pode dizer dos usos que fazemos dela e não em que categoria a enquadramos. Afinal, não somos ratos encaixotados, mas seres com possibilidades em cada esquina, em cada olhar, em cada passo.

No fundo acho que essa história dos rótulos [e aqui não falo apenas dos sexuais] serve apenas para tornarmo-nos mais previsíveis aos outros, um modo de não surpreendermos a cada instante, uma maneira de garantirmos o que esperar daquelas pessoas que conosco estão. Mas... isso não me apetece. Gosto de viver na lâmina e no movimento, melhor ainda se for movimento sobre a lâmina.

Resumindo, quero evitar definições. Não quero partir de um conceito do que sou, mas falar a partir dos modos como ajo. O outro caminho, pelo contrário, me aprisionaria. Por isso, hoje tomo a decisão de mudar o nome deste blog.

Doravante, quem por aqui passar lerá “Aventuras e Desventuras de um Ragazzo”.