sábado, 25 de abril de 2009

Bem-vindos ao Baile dos Frankensteins!

O que uma relação virtual que se prolonga por dois anos e um encontro explosivo de fim-de-semana têm em comum?

Idealizações...

Relações virtuais frequentemente carregam esse estigma. Bastam algumas palavras bem postas, um senso de humor que transmita leveza, um corpo razoável, algumas palavras que mostrem um pouco de cérebro. Uma receita infalível para que criemos mil expectativas. Ainda que cada um de nós considere-se bem vacinado contra frustrações, é frequente cair nessa emboscada. Esses dias mesmo, me peguei pensando durante a semana em alguém com quem tive duas conversas. Sim, foram papos bastante bons, mas ainda assim foram DOIS papos. E no íntimo, pensamos que conhecemos a pessoa, que é confiável para nos mostrarmos, interna e externamente, nome e pensamentos, imagem e angústias.

Mas, se não deixarmos essas expectativas irem longe demais, chega um momento em que há um estalo e pensamos: "onde é que eu estou com a cabeça?". Afinal, como podem alguns encontros virtuais nos dizer como uma pessoa é? Nem que fossem muitos. Faltam dados, faltam cheiros, faltam tropeções, falta aquilo que não se deseja mostrar e que é facilmente filtrado no msn. Basta se esconder off-line e o seu mau humor não é percebido por ninguém.

Expectativas são próprias de relações virtuais? Tenho acreditado que não. Na Cena 01, falei de um cara e tanto que conheci. Opa, jogo do um erro: qual é a falácia da frase anterior?

Como dizer que conheci alguém, na raiz de tal ação, em um fim-de-semana conturbado? Depois, ainda na fase do deslumbramento, passei dois meses conversando com ele por msn. Um dia ele me disse que eu era um anjo que havia passado na vida dele. Aí parei para pensar. Que anjo é esse? À distância é difícil ver se o que se usa são auréolas ou chifres.

O fim, ainda que seja paradoxalmente temporário, a maioria já sabe como foi, pois já passaram por algo parecido. Tem-se menos paciência para os papos supra-terrenos, na melhor definição de tal palavra. Supra-terrenos, pois não tem um terreno, um cotidiano para se respaldarem. São, sim, conversas divinas, ou melhor, divinizadas. Só que anjos de auréola, ou diabos à distância, cansam. A relação vai esfriando e, após algum tempo, fica a memória de uma relação bonita que na prática não aconteceu.

Pessimista eu? Penso que tenho me tornado realista. Relações que não possuem o quesito cotidiano para sustentá-las se perdem em sua eteriedade.

Um abaixo a relações virtuais? De modo algum, seria uma contradição com esse blog e com as horas semanais que despendo no msn. Creio que tenho visto tais relações como pontos de partida. Por mais que se idealize construir algo, por mais sólido que pareça, o peso e a sustentação só vêm como o tempo, com o dia-a-dia, no sorriso amarelo para a piada sem-graça, no xingão para o arroto escapado, no atraso para um encontro, na bobeira inconveniente que escapa em um momento sério...

Enquanto isso continuo nesse Baile de Frankensteins, com a consciência de que nessa festa o que vejo são apenas pedaços de argila que moldamos à nossa vontade, imagens que constituimos, máscaras formadas com retalhos próprios de quem as usa, mas que podem servir de pistas para os homens por trás de tudo isso. E aí está a possibilidade...

sábado, 18 de abril de 2009

Pessoas-argila: Cena 02

Hoje segue a segunda parte do post iniciado semana passada. Assim, a cama de gato fica feita para, semana que vem, propor uma discussão linkando as duas histórias.

CENA 02: Frankensteins

Três anos já se passaram desde aquela noite em que eu, meio insone com a cabeça cheia por conta de um lance que não se resolvia, fiquei vagando por horas a fio na internet, buscando qualquer um ou qualquer coisa que me aliviasse um pouco aquele incômodo. Não tinha necessidade de falar. Bastava-me escutar/ler/entender que havia mais pessoas que também não se encontravam.

Tentei os chats, dos quais nunca fui muito fã, mas tudo era muito superficial. Conversas que começavam com sexo ou então faziam rodeios para recair em sexo. Não era o que procurava.

Já meio desistente da busca, encontrei um blog que falava de experiências de um bissexual. Comecei a lê-lo e ali me encontrei em diversas passagens. Rolou uma vontade forte de conhecer aquele que postava, que conseguia exprimir com bastante segurança o que eu sentia, mas que ficava entalado.

Após algum tempo, fizemos contato. Movidos a papos interessantes, que fugiam das trivialidades do dia-a-dia, começamos a gostar daquela nova amizade a ponto de mudarmos nossa rotina para que conseguíssemos nos encontrar on.

A distância de nossas moradas era um problema, o que impedia que nos encontrássemos. Teclamos, assim, por quase um ano. Aos poucos fui me envolvendo, coisa que achei que nunca ocorreria, ainda mais em uma relação virtual.

Depois de quase um ano, fizemos um esforço e nos encontramos, ainda que nessa tomada de decisão muita coisa tenha dado errado. Quando o vi, me senti à frente de um estranho. Pensei: "Quem é você? Não conheço seu cheiro, não conheço seu modo de andar. Não conheço o modo como você espirra.". Realmente não tinha idéia daquelas pequenas coisas que não nos damos conta e que nos ajudam tanto na constituição do outro.

Não me senti atraído à primeira vista. Tanta coisa que havia imaginado e ele na minha frente tão diferente. A coisa mudou um pouco depois, insolitamente e simbolicamente, quando tomávamos nosso café-da-manhã e ele, nervoso, deixou cair um pão-de-queijo no chão. Na hora pensei: "Ele é apenas humano, como eu".

Durante a semana, que sabíamos ser a única que teríamos, tentamos em vão aproximar os homens-msn dos homens-reais que estavam frente-a-frente. Não aceitávamos que há coisas que tem seu próprio tempo. No último dia, triste, me sentindo mal por todos os castelos de areia contruídos, fui caminhar em meio a um temporal. Na chuva, coloquei a cabeça em ordem. Para não esquecer daquele momento, marquei-o me desfazendo de algo que eu gostava muito.

No dia seguinte fui embora aliviado. Ainda vi esse amigo algumas vezes. Nossa relação amadureceu e, ao mesmo tempo, esfriou. Há sempre a sombra do homem-msn que paira. Por mais que nos conheçamos hipoteticamente bem, pelas confidências que o anonimato tenha propiciado, faltam peças no puzzle do outro que contruímos com as nossas, o que dificulta o despontamento do homem-real.

No fim das contas, temos Frankensteins com peças nossas, peças dos outros, peças imaginadas, peças que não encaixam bem, que nos assustam quando estamos frente-a-frente ao vermos o mosaico mal montado.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Pessoas-argila: Cena 01

Trago duas cenas. Uma começou no real e terminou no virtual. A segunda iniciou no virtual e se encerrou no real. Ambas, contudo, com algo em comum...

Como o post ficaria muito longo, hoje vocês ficam com a primeira. Semana que vem trago a segunda. E, em seguida, o link, que clareará o motivo do título desse post.

CENA 1 - A Festa dos Ternos

Há alguns poucos meses fui visitar um amigo em outro estado. Acompanhando-o desde a adolescência, não poderia perder o fim-de-semana de festa que este daria em comemoração a um objetivo de vida alcançado.

Chegando lá, resolvi passar um fim-de-semana, uma vez que a viagem não era curta. Primeiro dia de festa, me senti como na música do Legião Urbana "...festa estranha, com gente esquisita, eu não tô legal, não aguento mais birita...". Definitivamente o pessoal da festa estava longe das pessoas com quem me divirto. E naquele dia não estava nem um pouco a fim de fazer um jogo político que usualmente faço bem. Estava em um momento um pouco nostálgico e gostaria de ficar só com minhas lembranças.

E entre algumas conversas sem muito conteúdo, a noite seguia. Fim de festa já, vieram dois caras já bastante bêbados conversar comigo. Bastante bonitos e simpáticos, começaram a conversa me perguntando se não havia assistido determinado filme que, na fala deles, "todos deviam assistir". O papo seguia quando um deles foi xavecar uma garota que passou. A conversa continuou até que o outro falou que ia estourar se não fosse ao banheiro. A cerveja já fazia efeito em mim também e fui junto. Ele foi pro box, eu pro mictório, que ficava ao lado das pias, com um espelho enorme. Quando meu novo amigo saiu do box, vi pelo espelho que seu zíper ainda estava meio arriado. Na hora me deu um calorzão. Quando tirou o paletó para lavar a mão, me dei conta de como o cara, além de bonitão, era forte, com o corpo esculpido pela musculação. Curti mais ainda quando vi um um tribal em seu tríceps. Sem contar que estávamos de terno, o que dava um charme a mais para a ocasião. Terminei de mijar, lavei a mão e nisso, nós conversando. Percebi que nós dois estávamos enrolando para sair. Na hora pensei: "será?...". Olhamo-nos, e rolou aqueles 2 segundos de um olhar preso ao outro. Eu falei: "você não quer sair, né?". Ele respondeu sem graça: "Não". Nos beijamos ali mesmo. Beijo rápido, pois estávamos encanadíssimos de alguém entrar. Saímos.

Lá fora, fiquei super preocupado de alguém perceber. Afinal, meu amigo não sabia nada de mim e, definitivamente, aquele não era um bom modo para ele ficar sabendo. Acabei nem ficando mais à vontade com o cara que havia acabado de beijar. Ele queria voltar e continuar. Chamei-o de louco e disse que estaria em uma festa do dia seguinte, que lá conversaríamos, acabando o papo por ali.

No dia seguinte, fui à festa. Estava bastante cheia e no fundo torcia para o cara não aparecer. Afinal, passada a bebedeira, um milhão de 'serás' vieram à minha mente: "Será que o cara não é queimado?", "Será que é de confiança?", "Será que alguém sacou nosso lance?". De repente, quando estava com um outro amigo conversando no balcão do salão, o cara aparece. Cumprimenta meu amigo como se fossem conhecidos de longa data, zuando, demonstrando bastante intimidade. Aquilo me aliviou um pouco. O cara parecia realmente de boa, amigo da galera e sem nenhum trejeito que a minha bebedeira do dia anterior tivesse me escusado de perceber. Cumprimentou-me, conversamos os três um pouco e ele entrou.

Mais tarde, encontrei-o na pista de dança. Lá, encobertos pelo som alto, conversamos com calma, trocamos telefone, combinamos de nos encontrar na noite seguinte, em que meu amigo não estaria na cidade, o que facilitaria meu sumiço.

No dia seguinte, sumi propositalmente durante o dia. Quando voltei, falei para o pessoal que mora com meu amigo que havia conhecido uma garota, e que havíamos combinado de sair. Falei ainda que ela tinha namorado e por isso tudo tinha que ser muito sigiloso. A história colou.

À noite, ele foi a um jantar para desbaratinar e depois nos encontramos. Rodamos com o carro por bastante tempo. Não parávamos em nenhum lugar com receio de alguém conhecido nos ver, o que contrariaria as histórias contadas para nossos amigos. Terminamos indo para um motel, mais mesmo para podermos conversar com tranquilidade do que para qualquer outra coisa. Palavra de escoteiro!

No motel, o instinto falou mais alto. Estávamos nos curtindo demais, física e psicologicamente. Acabamos transando, mas não foi isso que me encantou nele. Depois da transa, ficamos deitados por bastante tempo falando sobre nossa vida, com uma perna em cima da outra. Um acariciando a coxa do outro, fazendo piadas, rindo, falando coisa séria. Uma cena bonita de se ver. Nada exagerado, nada meloso, apenas uma coxa sobre a outra, sem necessidade de grudar no outro, de limitar os movimentos do outro. As coxas sobrepostas eram o essencial, sem necessidade de mais.

Nessa harmonia instaurada, quase perdemos a hora de deixar o quarto. Na volta, falávamos de nossa vida, medos, objetivos, coisas sérias, coisas bobas. Quando me deixou, ele ainda me convidou para dar mais uma volta antes de ir embora. Senti vontade de ir junto, mas viajaria em algumas horas, sem saber se ou quando o veria novamente.

Nessa hora, a razão desceu como um trovão. Despedi-me e saí do carro. Fui dormir meio alegre, meio triste. Alegre pela noite e pelo cara especial que havia conhecido. Triste, pois era algo assim que procurava e sabia, no fundo, que não sentiria essa sensação tão cedo novamente.

sábado, 4 de abril de 2009

Ameaça ao armário

Essa minha impulsividade ainda me trará problemas...

Postei há duas semanas um lance que aconteceu com um amigo de trabalho no fim de uma festa. Um breve resumo para quem não leu: bêbados, fomos tomar uma ducha depois de termos caído na piscina, e ali nos pegamos.

Na hora foi super excitante. No dia seguinte, sábado, enquanto escrevia o post, me sentia bastante vivo. À noite, saí leve. Ri, conheci gente nova, me diverti. No domingo, contudo, levei um susto quando minha perseguidora (que agora me persegue de um modo diferente, à moda de uma mulher com o orgulho ferido, me alfinetando sempre que pode) me liga: "Ae Ragazzo, nunca pensei isso de você hein (risada cínica)... Quer dizer que agora você e o ------ tomam banho juntos?". Na hora gelei. Senti as pernas bambas, mas sabia que era hora de eu usar todo meu cinismo e racionalidade para evitar quaisquer estragos maiores. Resolvi sondar, jogando um verde: "Por que? Você não daria banho em um amigo bêbado? De onde você vem não é assim, não? Aqui se bebe junto e se vomita junto também!(risada falsamente natural)". Ela riu também e me chamou para almoçar. Minha vontade era xingá-la, mandar ela tomar conta da vida dela, mas racionalizei e percebi que a melhor coisa que eu poderia fazer era ir ao almoço com o pessoal, sondar o que efetivamente viram, sabiam ou desconfiavam.

Lá chegando, nem zoaram tanto. Apenas o normal, sem ultrapassar nenhum limite. Só mesmo a louca da perseguidora que tentava jogar o assunto na roda, mas como o pessoal não curte muito ela, que sempre quer ser a estrela em tudo, não davam trela, até que ela desistiu.

Primeira sondagem, ok, mas precisava de mais detalhes. Fiquei tenso nos dias seguintes, sem saber direito o que havia ocorrido. Pensei em me assumir, afinal, melhor saberem pela minha boca do que ser alvo de fofoca. Não suportaria que tivessem certeza de algo de forma velada. Tranquei-me em casa e me pus a pensar de modo bem racional nas vantagens e desvantagens de me assumir. Cheguei a algumas conclusões, que pontuei:

a) em termos profissionais, não perderia meu emprego nem nada, mas com certeza a imagem de respeito que eu transmito teria que ser batalhada com mais afinco e de modo frequente, pois de tempos em tempos trabalho com um grupo diferente de pessoas, de modo que a cada grupo seria uma nova batalha. Ou seja, desgaste constante.

b) fora amigos de net, 99% de meus amigos são héteros. Sei que alguns, passado um baque inicial, aceitariam numa boa, mas outros entrariam em dilema e, ainda que conscientemente quisessem aceitar, mudariam sua postura comigo. Seria um possível adeus à naturalidade. Não há como desligar de uma hora para outra toda uma criação, concepções de vida e de conhecimento. E mais, não os julgaria por essa impossibilidade. Acho besteira aquele dizer de senso comum "se são seus verdadeiros amigos, vão aceitar". É um modo simplista e dicotômico de ver as coisas. Também tenho meus paradigmas que sei serem difíceis de serem quebrados. Assim, procuro respeitar os dos outros.

c) sou uma pessoa bastante conhecida aqui, muitas vezes por pessoas que eu mesmo desconheço. Assumir que curto caras possivelmente me levaria a ser rotulado por muitas pessoas como sendo parte de um grupo que só me identifico pela sexualidade. O pior é que não teria a possibilidade de estar ali para mostrar como eu sou, como são minhas características, e que estas pouco tem a ver com o rótulo social para homo/bissexualismo. Entraria em um mecanismo de rotulação social que não me apeteceria em nada.

d) em relação às vantagens, não encontrei muitas. Poderia dizer que eu me movimentaria mais livremente, mas não acho que seja verdade. Sou muito ligado, infelizmente, ao que as pessoas pensam. Assim, viveria com receio de ser mal interpretado. Por exemplo, provavelmente, evitaria dar um abraço apertado em um amigão, para evitar que ele pensasse que há malícia no abraço.

e) por fim, em termos de encontrar caras com os quais eu me identifico, creio que me assumir dificultaria as coisas. Afinal, os, digamos, do grupo dos discretos, procuram outros discretos e, uma vez assumido, e conhecido como sou, dificilmente me veriam com alguém sem imaginar que rolasse alguma coisa.

Desse modo, decidi que não era hora para eu me assumir e comecei a pensar estrategicamente como sair da enrascada em que eu me meti. Comecei tentando avaliar o tamanho do problema. Para isso, arrumei um jeito de encontrar o cara que eu fiquei no msn.

Lá ele me explicou que o cara que divide casa com ele foi até o banheiro pra ver se a gente estava passando mal e que da porta escutou uma conversa nossa, que ele chamou de filosofia de banheiro. Depois comentou com a perseguidora, que passou o dia seguinte a cuidar da ressaca de meu amigo. Ela apenas estava me zuando de encheção. Não sabia de nada, tanto que continuava a ficar com o cara.

E ele? Desde aquele dia, só o vi duas vezes, ambas em reuniões que eu presidia. Na primeira, foi bastante constrangedor. Ainda não havíamos conversado no msn. Na segunda, depois de haver esclarecido tudo, estava tranquilo. Conversamos, até fizemos piadas. Na hora pensei: "esse cara é do bem. Creio que uma amizade sem máscaras está nascendo."