sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Ragazzo em Terceira Pessoa

Sim, o Ragazzo está acuado... o Ragazzo ficou sem dormir bem no fim-de-semana.

O Ragazzo também é simples às vezes. Ele quer conhecer melhor o que existe no meio dessa ponte aérea. Ele quer conhecer o mau humor matinal de quem ele quer estar junto. Ele quer saber qual é o limite do constrangimento nas piadas sem graça. Ele quer saber o que apurrinha o outro. Ele quer saber o que faz o outro ficar com cara de bobo. Ele quer saber o que o deixa sem palavras. Ele quer saber quando o outro é desajeitado.

E o que o Ragazzo quer ver?

Ele quer ver a cara amassada do outro de manhã. Quer ver se agüenta correr 10 quilômetros à beira-mar com ele. Quer ver se o outro ainda fica de bom humor depois de ser chamado dezenas de vezes de baixote e de manezão. Quer ver ele mandar o Ragazzo parar de fazer bobeira ao ficar com dor-de-barriga por não conseguir parar de rir.

E sabem o que incomoda o Ragazzo? Incomoda ele saber o que ele quer, mas não se sentir no controle para decidir nada. Logo o Ragazzo, sempre no controle de sua vida, se sentindo uma vez como ator coadjuvante em uma cena importante de seu próprio livro...

E sabem o que incomoda mais ainda? Sabem o que dá raiva no Ragazzo ao pensar em si mesmo? Dá raiva de o Ragazzo não ser mais ignorante. Por que ele tem sempre que entender a situação dos outros? Talvez um pouco de egocentrismo nessa hora fosse bom.

E lá vai o Ragazzo, desafiando os limites de sua própria racionalidade, que a todo momento luta com sua passionalidade. Sorte dele que essa briga já vem de casa. Herança genitora. Racionalidade do pai, passionalidade da mãe. Dois extremos em uma mesma casa. Daí o fruto disso existir dentro do próprio Ragazzo. Ragazzo e meio termo não combinam.

Não, o Ragazzo não está apaixonado. Ele está encantado, com vontade de mostrar mais de si e de olhar com atenção para o outro. O Ragazzo não quer prometer e não quer promessas. Ele quer a naturalidade do fluxo. Mas para isso ocorrer, ambos tem que aceitar o rio.

No fim das contas, dá para sintetizar tudo em uma frase.

O Ragazzo, pensativo, disposto e exposto, ainda que para falar isso precise usar a terceira pessoa, para, pensa e sente: está na hora de cuidar de alguém.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A Quadrilha

Semana passada, um casamento de um casal de grandes amigos. Oportunidade perfeita para rever pessoas de longa data. Farra até tarde, bebedeiras memoráveis relembrando os bons tempos, certo?

Errado!

Em um salão com quase cem pessoas não acreditava no que via. Apenas 3 pessoas despareadas. Eu, claro, uma delas, mais outro cara e uma garota que eu até então desconhecia. Em volta, rostos conhecidos marcados pelo tempo e barrigas batizadas pela cerveja com as namoradas/esposas e um ou outro bebê. No fim das contas, a bebedeira e as risadas foram salvas pelos solteiros do salão que inteligentemente se uniram.

Muitos uísques depois, o fantasma de Drummond de Andrade parece ter baixado na sala declamando um poema que muito me divertira na infância:

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.

João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

E o cara solteiro olhou com cara de lobo mau para a garota solteira, que depois de uns champanhes a mais, de Chapéuzinho Vermelho se tornou femme fatale, chamando umas 3 vezes o Ragazzo solteiro que vos escreve para "dar uma volta fora do salão".

Ragazzo, por sua vez, até teria ido, se não fosse estar com a cabeça em outro estado e na justa hora ter recebido uma mensagem que o deixou o resto da festa com cara de bobo risonho:

"Esse Ragazzo, que fica mexendo com quem tá quieto."

sábado, 10 de outubro de 2009

Ponte Aérea?

Os números: 10 dias, umas 20 horas, por volta de 4 madrugadas, mais de 1000 quilômetros, 2 pessoas.

Ele voou 850 km, eu viajei 180.

Ele deixou os pais no meio de um jantar. Eu adiei a visita aos meus.

Ele esperou minhas mensagens em um restaurante. Eu, apressado e ansioso, me perdi em um caminho conhecido.

A primeira palavra que ele falou foi "Mané". A primeira minha foi "Baixote".

Ele desviava o olhar e dizia "contae". Eu bebia rápido.

Ele me ensinou técnicas de convencimento virtual. Eu mostrei a ele como se brindar.

Ele me tentou com os olhos e eu a ele com as pernas.

O primeiro beijo foi rápido e em um lugar inconveniente. Não deu pra segurar, e vieram muitos depois, também em lugares inconvenientes.

Acertei-o com uma bolacha-de-chopp-frisbee na cara e derrubei-o no chão. Ele se lembrou disso no dia seguinte sorrindo.

E as descobertas?

Ele descobriu que sou amante de cinema e que curto pintura e fotografia. Descobriu que não vejo TV e que fiquei mais de ano sem a Globo em casa. Descobriu que eu jogava futebol e vôlei e que adoro esportes que envolvem altura por causa da adrenalina. Descobriu, também, que sou brincalhão, beirando ao bobo, e que rio de lado quando estou sem graça.

Eu descobri que ele é carinhoso quando fala "Mané" e que fecha os olhos quando recebe cafuné. Descobri que não conhece nada de filmes, mas que vai assistir os que eu mandar para ele. Descobri que ele gosta de molho vermelho com camarão, que adora correr na praia e que tem braços e um peito invejáveis.

E juntos vimos o dia raiar.

Ele com a marca de sunga. Eu com a marca de minha ascendência.

Eu sentindo sua respiração até ele, constrangido, dizer baixinho que tava com o nariz entupido.

Entrelaçados.

Ele com frio, colocou a camisa. Eu, calorento, tentei esquentá-lo.

Deitados. Olho no olho.

Ele tem um compromisso há 2 anos. Eu odeio saber disso.

Eu tenho dificuldades para me envolver. Ele também sabe disso. Por vezes, me parece que para ele isso se torna um receio; por outras, um incentivo à conquista.

Ele olhou confuso querendo certezas. Eu, com medo da responsabilidade e do futuro incerto, respondi mudo.

Ele foi embora. Eu também.

Mas no meu ir embora, lembrei de uma música esquecida há muito tempo:

"E, mesmo com tudo diferente
Veio mesmo, de repente
Uma vontade de se ver..."

E hoje, no almoço com minha mãe em um restaurante, depois de dormir apenas 2 horas, peguei-a olhando de modo estranho para meu prato:

- Engraçado, meu filho. Sempre achei que você não gostasse de camarões...

terça-feira, 6 de outubro de 2009

O Bom Samaritano

É... em momentos em que preciso pensar para tomar uma decisão, prefiro não falar sobre o "problema". É um modo de ir digerindo-o aos poucos, saboreando cada parte do que se passa. Nesse movimento atento, quero descobrir se gosto ou não do gosto novo e o porquê disso. E no meio tempo, por que não uma história antiga? Uma daquelas que não foram importantes, a ponto de sumirem da sua mente, mas que volta e meia são lembradas com certo sorriso no canto da boca.

Certa vez em uma cidade praiana há não muito tempo, fui a um bar com um amigo. Ali me entretive em uma outra roda de pessoas e meu amigo, tendo que acordar cedo no dia seguinte, foi embora. Eu, animado com a conversa, decidi ficar mais.

Muitos causos e gargalhadas depois, já no alto da madrugada, paguei minha conta, o bar fechou, nos despedimos e fui embora. Pensei: agora é só pegar um táxi e dormir como um anjo.

Pensei errado. Cinco minutos depois me dei conta que algo tinha acontecido com minha carteira. No grau alcoolico em que estava, não sabia se tinha sido furtado ou se a havia perdido. De qualquer modo, isso era o que menos importava. Os fatos eram simples: estava sem carteira e sem celular [havia deixado na casa de meu amigo] em uma cidade em que não conhecia quase ninguém.

Racionalmente [ao menos na razão que a bebida me permitia naquele momento] decidi que iria a pé. Sabia que bastava contornar a avenida da praia e uma hora chegaria na casa de meu amigo. Só não sabia a distância. E para isso, ao ver um cara bonitão passar, decidi descobrir.

- Falae Grande, tal lugar fica a quanto tempo a pé daqui?

- Tá louco? A pé tu só chega amanhã. É muito longe. Pega um táxi.

Contei o que havia acontecido.

- Ah cara, que azar. Tu tem que tomar mais cuidado por aqui. De qualquer modo, tu parece de boa. Eu te empresto a grana pra um ônibus que roda a noite toda. Ir a pé, além de longe, é perigoso. Mas tô sem grana aqui, que desci só pra dar uma volta porque discuti com minha namorada. Moro a duas quadras daqui. Vamos comigo, que eu pego a grana pra ti.

Fomos juntos. Ele cumprimentou o porteiro. Entramos e subimos ao andar dele. Ele pediu pra eu ficar fora do apartamento, pois a barra lá não tava boa por conta da namorada. Ele entrou.

Nova discussão do casal. Eu, no hall, escutava tudo extremamente constrangido. Ficava imaginando a namorada dele saindo pra xingar o "vagabundo do hall", novo amigo do namorado que só aprontava. Minha vontade era de sair correndo o quanto antes. E quando estava prestes a fazer isso, o cara voltou.

Ele chegou e a primeira coisa que fez foi me dar o dinheiro. Agradeci e fui guardá-lo. Nisso, ele foi me levando para as escadas. Demorou para eu perceber que enquanto eu enfiava a mão no bolso, uma outra mão entrava na minha calça. Creio que estava tão nervoso com a situação que demorou para cair a ficha do que estava acontecendo. Foram 5 segundos de apatia total [sorte que ele foi devagar a ponto de eu me reconstituir]. Quando me dei conta, olhei pra ele e pensei: Por que não?

E a namorada barraqueira do cara, do lado de dentro do apartamento, emburrada provavelmente por uma besteira qualquer mal imaginava que o namorado chupava um cara nas escadas de emergência, a poucos passos dela.

Na volta, ainda não acreditava no que aconteceu. No ônibus, tentava a todo custo lembrar do telefone que ele me havia passado para no outro dia termos mais tempo para continuar o que começamos. Foi uma frustração quando, no meio do caminho, entre um pulo e outro do ônibus, percebi que já não tinha a menor idéia do número [nem do nome dele].

Nunca mais o vi.